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  • Nah Jereissati

Do sangue de ser mulher


A minha pele sangra. Todo dia 8, todo dia 9, todo dia morrem 10.

A minha pele sangra. A cada palavra deles, a cada pedra deles, a cada luta nossa.

A minha pele sangra. Desde que eu nasci, sempre que eu renasço, sempre que eles me matam.

A minha pele sangra. Quando tu me jogas essa flor, sempre que eles usam aquela cor, toda vez que nos rotulam.

A minha pele sangra. Porque ele me odeia, porque você me odeia, porque o mundo sempre me viu inferior.

A minha pele sangra. Porque eu sou mulher, porque meu coração é de mulher, porque minha pele é mulher-feita.

A minha pele sangra. Porque eu existo, porque eu me identifico, porque eu quero voz.

Dez irmãs minhas morrem por dia. E nós temos um dia no ano, milhões de casos sem soluções, outros tantos nem sequer investigados. Temos denúncias não feitas por ameaças, existências mutiladas por ilegalidades, corpos violados por pura vontade de se sentir superior. Dez irmãs minhas morrem por dia. Por existirem. Por serem. E nós estamos pedimos demais, já temos voz demais, já existimos demais, queremos demais. Dez irmãs minhas morrem por dia. E eu não posso mais lutar, mas você pode me rotular, pode me apregoar, pode querer me comandar. Dez irmãs minhas morrem por dia. E não vai ser o teu medo que vai nos derrubar. O nosso dia é qualquer dia que uma de nós lutar.

O meu sangue sangra fácil – mas custa caro.

O meu sangue sangra fácil – mas a cicatriz nunca sara.

O meu sangue sangra fácil – mas nunca se cala.

Quero a minha carne exposta à luta por minha existência, por meu corpo, por minha identidade. Quero que a minha carne sangre junto à de minhas irmãs e que tenhamos nossa voz cada vez mais alta. Eu quero poder ser mulher e não simplesmente o ser que não é homem, o ser que é submisso, o ser que é menor. Eu quero poder receber igualmente, andar livremente, respirar o mesmo ar e não me engasgar com palavras que nunca foram minhas. Eu quero poder existir.

A minha pele sangra. E eu quero sangrar.

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